Dadaísmo: PICHADORES, MAIS QUE CHOQUE ESTÉTICO...
Luciana
Carrero
A
angústia dadaísta vai escalando paredes e traçando indisciplinados riscos
repugnantes nas arquiteturas, material ou simbolicamente falando. Os pichadores
causam choque estético e retratam a eterna violência que vem dos profundos
escaninhos das mentes e se materializam nesta espécie de arte do subterrâneo,
exposta desaforadamente. Algo de brutal nos mostram, também de assustador,
presença marginal que intimida e nos leva a não pensar em nada, porque não
queremos adentrar aos umbrais desta loucura diabólica.
O
pichador; o motoqueiro que rompe os tímpanos do sossego público com o ronco
premeditado de sua máquina, o motorista que traz o som de um trio elétrico no
automóvel de passeio; o ser humano que se joga no meio do passeio público,
expondo sua má sorte, suas mazelas, seu aspecto tetraplégico; as pessoas que se
movem de ternura e andam abraçados com cães sarnentos e fazem questão de dizer
isto e de, ao mesmo tempo, culparem os outros por não fazerem o mesmo; até
mesmo aqueles que dizem que entre humanos e cachorros preferem os cachorros,
são todos dadaístas inconformados que querem, consciente ou inconscientemente
escandalizar. Os toniolos da sociedade esbanjam criatividade para incomodar,
estressar, atordoar o mundo. Ninguém quer parar, sequer para analisá-los.
Dissecá-los é dar-lhes asas, importância, razão. Não há lei que ouse punir
estes demônios que, tal matilhas devoradoras, vão semeando efeitos destrutivos
no meio-ambiente. Isto a ponto de formarem quadrilhas, legiões de encapuçados
nas madrugadas, subindo como aranhas e rasurando matéria bruta com raízes que
se espraiam para nossas almas boquiabertas e para a sociedade impotente diante
da sua presença nefasta. Ou aqueles que nos agridem na condição humana. A todos
estes tipos, em menor ou maior grau, podemos colocar no mesmo patamar: os
assassinos em série, jovens que matam os pais, pais que dilaceram filhos,
estupradores, pedófilos, pessoas anti-sociais, como as que criam cães ferozes.
A população vai entendendo toda esta violência como uma coisa só, e é esta
mesmo a verdade. No caso específico dos pichadores, nem habitando no trigésimo
andar de um edifício totalmente impossível de escalar, estaremos livres. E no
caso dos outros "ores" e "ófilos", basta estarmos vivos
para sermos potenciais vítimas. Eles chegam a todo lugar sanguessugando paredes
ou, com suas garras imensas, se servindo de inocentes úteis às suas práticas
cruéis. Semeiam o medo. Mais que um choque estético, são um descomprometimento
ético e a revolução própria da loucura incontrolada, a cultura do diabólico.