terça-feira, 24 de novembro de 2015

# "A Juventude dos Desejos"

Crítica Literária? Não! Apenas um estudo útil aos poetas novos

Luciana Carrero

Vejam só a minha pretensão: estudar e pronunciar-me sobre o poema do acadêmico Joaquim Moncks, titular de Cadeira na Academia Riograndense de Letras. Mas não resisti à tentação e, a seguir, está o resultado. Foi mais um exercício para um estudo meu do que propriamente um parecer, pois nenhuma observação minha poderia interferir no ambiente do poema, já que a liberdade ampla é uma força incontestável do poeta, segundo penso. Em sendo um estudo meu, que venha como colaboração ao estudo de outrens. Quanto à minha pretensão, perdoe-me o autor, que anda num patamar acima da minha modesta interferência.

Sobre o poema “A Juventude dos Desejos”

Certas afirmações, dúvidas ou mesmo indagações, no meu pensar, destoam, neste significativo poema. Coloquei em negrito para que estudem se seriam necessárias no contexto; ou ainda, se poderiam ser ditas de forma afirmativa, para não emprestarem um que de pusilanimidade ao poema.
A naturalidade do poema, onde o poeta se esconde em nome da universalidade, como neste, ficaria melhor a favor do poema e não do poeta e suas fraquezas existenciais (negritos); ou de algum personagem fortuito, que relampeja (negritos), de vez em quando, na área da criação essencial. O eventual aparecimento, mesmo que não nitidamente explícito do eu ou das suas relações e/ou observações híbridas ao contexto, podem macular o poema.
Neste autor, no seu laboral ofício, em geral, a grandeza de anular-se em favor da arte e talvez visando a melhor apropriação pelo interlocutor. Se é para ser assim, então que seja completamente.
Quanto a outros aspectos, posso dizer que inferi um pouco daquela fluência de Neruda. Note bem que falei fluência e não influência. Em termos comparativos, no pensar rápido ante os meus sentidos instigados, passaram juntos, ao decorrer da leitura, Maikovski, Pessoa, Leminski e, mais fortemente João Cabral de Melo Neto, este último, mormente, pelo fato de ser mais exigente na estética, como o autor ora estudado. Entretanto, nenhum destes, nem mesmo Neruda, encostariam neste poema, talvez até por serem de outro contexto histórico, ou ainda porque não são plenamente identificáveis ao citá-los. É só uma constatação. Enfim, um poema que tem a consciência de um novo homem, de um novo tempo, e trabalhado com a profissionalidade da adequação ao espírito que o próprio autor preconiza em seus ensinamentos. Para melhor digerir o texto, e poder analisá-lo com maior propriedade, o dividi em estrofes, que me parecem, até para o leitor, mais absorvíveis. Concluo classificando como um excelentíssimo poema. Se fosse participar de um Concurso, por estes não direi nada, pois os critérios deles são obscuros. Salvo melhor juízo. (Luciana Carrero, produtora cultural).


A JUVENTUDE DOS DESEJOS

Joaquim Moncks

A primavera já se despediu há muito.
Surge a surpresa das tardias entregas.
O desejo espera o gozo sem asperezas.
Não é somente ele que fala.

A linguagem úmida assoma o corpo.
Outra madrugada de pomos e maçãs.
É tardio este sentir que obriga a jogar fora
a camisa prenhe de suor e ânsias...

Escorre o orvalho de sons, ouvidos e poros.
Sempre há esperança de que o amor venha:
tardia rosa de esperanças empalma espinhos
curte a sua incontrolável diáspora.

Pode-se conservar a emoção das esperas?
E o sono boceja de todo enlevo,
artérias e cálice, vinho noviço.

O menino acha que não morreu
o amor de amar na solidão propícia.
É um autômato saído de dentro do poço
sua armadura em pele e osso pinta o rosto.

A intuição inspira o verso.
O reverso costura o estar vivo ou morto.
Esperança de ser ouvido e levado a sério.

Não há como traduzir a doçura,
se não pela flor que nasce, cigarra
no meio da noite, pedindo vaza
registro dos tormentos e o dia seguinte.

Sobrevém o estado de graça: o direito ao amar
absolve a tudo, sopro de melancolias e ausências.

Quase sempre o amor é um sino mudo,
e o poema come o rabo do capeta,
bota a boca no mundo, pede passagem.

Nenhuma vez o amor foi tão opressor
talvez venha pra minimizar o medo.
Nunca sabe o condenado qual horizonte é este:
sopra-lhe ao nariz e aos ouvidos o silêncio
faz-se cair da cama pra declarar a vigência
a decretação da liberdade sempre pura do amar.
A mensagem aporta, telepática, hermafrodita,
talvez agora possa dormir livre dos notívagos suores
que ainda empapam a fronte e o pudor entre coxas.

Corre, ao adormecer, um rio de nádegas, suor e sumos.
Que durmas bem, falante desconhecida e desconexa.

O impudico induz ao não-dizer (e a sensação é boa)
e guarda a caneta – a incorrigível delatora.

Aquele que ama, mesmo que não saiba,
tem na garganta a voz do vento.


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